Vi-te ao longe quando a minha sombra era sobejamente
conhecida dos meus olhos. Eras Atlântico, verde, lindo. Inacessível também
embora agora saiba que arrastavas a areia com as tuas ondas, ali bem perto de
onde morei. Soube-o quando me passeei o ano passado na marginal de Gaia.
Na
altura nunca imaginei que tivesse o mar não muito distante. Naquele tempo tudo
parecia longínquo e inacessível. Era o tempo em que as roupas eram escassas, os
pés descalços, os sapatos caros para os gastar em caminhadas inúteis, os
automóveis, de ricos, os tostões para o autocarro, muito caros, o conhecimento
curto, o mar em imagem.
Tão perto sem que te tenha tocado, sem que me
levasses para longe no balançar das ondas, olhos famintos desejosos de
horizontes mais distantes. Ouvi o teu som num búzio encostado ao ouvido quando
visitei um parente dum marinheiro. É o murmúrio do mar, disse-me e disse-o
naquele tom de quem se sente conhecedor do mar só porque tem um búzio sobre a
mesa e porque ouviu umas histórias a um marinheiro. O som podia não ser
completamente fiel ao bater das ondas, as histórias podiam ser uma hipérbole,
mas, na verdade, aquele ancião do interior sabia muito mais de mar do que eu
sabia.
Eu sabia! Eu sabia que o meu olhar de centelha,
desejoso de outros horizontes havia de poisar nas ondas, viajar pelos
horizontes longínquos a confundirem-se com o céu no exacto ponto onde o sol se
põe, onde as águas fazem espelho e as gaivotas já nem pontos são no firmamento.
Era Índico. De manhã calmo, agitado à tarde. Às vezes
também era raivoso de manhã, mudava de humor frequentemente, umas vezes mais,
outras menos, dependendo da praia. Um dia virei-lhe as costas para fugir duma
onda; engoliu-me e vomitou-me depois. Eu engoli água, muita água, água e areia.
O grupo em grande divertimento a cortar ondas e a saltar ondas em grande
euforia não se apercebeu. Lembro-me que me senti enrolada trezentos e sessenta
graus não sei quantas vezes e depois fui trazida para a areia como concha vazia,
pela onda que me serviu de tábua de salvação. Fui forçada a tossir e a água
armazenada finalmente saiu e respirei. Sobrevivi e não mais me aventurei em
ondas traiçoeiras e, sobretudo nunca mais virei as costas ao mar. Agora
abraço-o. Do Índico tenho uma saudade infinda. Abraço o Atlântico. Fui perdendo
o trauma e aos poucos, tornei-me amante do mar. Breves incursões noutros mares
mais calmos, dorminhocos mesmo e, para dizer a verdade, é na ondulação que
gosto me sentir viva.
Lamento
ter que te confessar, Atlântico, a ti que com paixão platónica amei. És para
mim uma sombra de uma lenda que vivi num Oriente de costa, onde as águas eram
tépidas, onde as praias eram imensas onde o sol ardia não fossem as sombras dos
pinheiros que povoavam as dunas e quase se aventuravam mar dentro.
Apesar
disso, apesar de seres frio, apinhado de gente e motas de água, aprendi a
amar-te e a paixão platónica de início, transformou-se em carnal, não sendo
capaz de estar muito tempo sem te visitar.
Me perco…
Bebo-te
com as mãos
Beijo-te
com os olhos
E
acarinho-te com o corpo
Quando
por ti adentro
Entro
…
Mar
de espuma, revolto
Transparente, verde
Aroma de beijos
Força de abraços
Poltrona de seda
Onde me deito.
Mar, mar!
Mar tão imenso
Paquete de cristal feito
Que me leva a viajar…
Contigo vou
Contigo volto
Na tua brisa.
Transparente, verde
Aroma de beijos
Força de abraços
Poltrona de seda
Onde me deito.
Mar, mar!
Mar tão imenso
Paquete de cristal feito
Que me leva a viajar…
Contigo vou
Contigo volto
Na tua brisa.
No
ondulado de teu cabelo
Mar
amado, me perco...
Me perdo…
Bebo-te
cun las manos
Beiso-te cun ls uolhos
I acarino-te cun l cuorpo
Quando por ti adrento
Me meto.
Mar de scuma, rebuolto
Transparente, berde
Aroma de beisos
Fuorça de abraços
Scanho de seda
Adonde me deito.
Mar, mar!
Mar tan eimenso
Paquete de cristal feito
Que me lhieba a biajar...
Cuntigo you scapo
Cuntigo you torno
An tou airico lebe.
Nas óndias de l tou pelo
Mar amado, me perdo...
Beiso-te cun ls uolhos
I acarino-te cun l cuorpo
Quando por ti adrento
Me meto.
Mar de scuma, rebuolto
Transparente, berde
Aroma de beisos
Fuorça de abraços
Scanho de seda
Adonde me deito.
Mar, mar!
Mar tan eimenso
Paquete de cristal feito
Que me lhieba a biajar...
Cuntigo you scapo
Cuntigo you torno
An tou airico lebe.
Nas óndias de l tou pelo
Mar amado, me perdo...