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Sintra/Miranda do Douro, Portugal
Gosto de pintar,de escrever e de fazer trabalhos manuais.Sou simples e verdadeira. Tenho que pôr paixão naquilo que faço, caso contrário fico com tédio. Ensinar, foi para mim uma paixão; escrever e pintar, continua a sê-lo. Sou sensível e sofro com as injustiças do Mundo. A minha primeira língua foi o Mirandês. Escrevo nessa língua no blog da minha aldeia Especiosa em, http://especiosameuamor.blogspot.com em Cachoneira de Letras de la Speciosa e no Froles mirandesas.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Ainda hoje



Inês irritava-se que assim fosse.
Porquê que havia de ser concha fechada no fundo do Oceano, bicho a hibernar à espera de crescer, para ser a delícia da gula num piquenique qualquer.
Ela era concha sim, mas de asas abertas, a esvoaçar, ela era uma borboleta colorida. Tão colorida, santo Deus!
Porquê que há-de uma borboleta ficar de asas fechadas no fundo do oceano, uma borboleta de asas fechadas ao frio, com cores esbatidas por falta de luz, uma borboleta anémica e despigmentada.
Ela tinha na alma o céu com o voo dos pássaros, nos olhos as flores com o tactear constante das borboletas, no ventre o pólen com o rodopiar das abelhas em luta renhida, no coração o néctar com o trepidar nervoso do beija-flor em busca de mel em luta de loucura a bater as asas e o bico a penetrar no gineceu das flores, até à mais íntima das entranhas.
Porque havia de ser assim, aquela castração de menina mulher poema, mulher viola em serenata, só porque qualquer cor ofuscava o negro de que se vestiam, de que se vestia todo aquele tempo!...
Porque havia de ser assim, só porque um beija-flor pudesse agitar o doce no gineceu das suas entranhas ou tocasse no botão de rosa e em sensualidade, uma rosa desabrochasse.
Um olhar, um convite para dançar...
Um olhar imenso, do tamanho do prado verde na Primavera, da doçura da calmaria das searas de trigo loiro no mês de Julho.
O olhar tremeu, o corpo muito mais, ramo agitado pelo vento.
O que faço, perguntou-se uma parte dela? Não, o que dirão!...
Estás parva, respondeu a outra metade com as pernas bambas e o coração a bater em golfadas de sangue quente, descompassado.
Envolveram-se em braços, arfares em pleno Inverno ao mínimo toque de olhares e de dedos. Mãos que tacteavam, rostos próximos a misturar os perfumes dos cabelos, perfumes bravios a carqueja e esteva, tão bravios como os seus corpos, tão docemente bravios e pungentes. Corpos entumecidos na melodia que já não ouviam, na música dos passos, os passos dos corpos em canção, corpos que tocavam, que tremiam.
Depois um olhar vigilante e uma quase vergonha de qualquer coisa que vergonha não seria á luz dos impulsos. Um braço esticado, um desapegar, um resfriar, um céu interrompido, um purgatório não merecido.
Irritava-se que assim fosse, mas tinha que ser. Porque havia de ser!?
Ainda hoje se irrita que assim tivesse sido!...

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